O Vitória estava na zona de rebaixamento rumo à quarta divisão, mas transformou seus rumos e carimbou o acesso de volta à Série B neste final de semana, com grande apoio de sua torcida
O ano de 2022 parecia alongar o desespero do Vitória. As dificuldades financeiras e os entraves institucionais se combinavam com um desempenho péssimo dentro de campo. Os rubro-negros, que já vinham do rebaixamento na Série B, sequer avançaram à fase de grupos da Copa do Nordeste e à fase final do Campeonato Baiano. Assim, o início na atual Série C nem surpreendia, com o Leão da Barra flertando com um inédito descenso para a quarta divisão. E por isso mesmo a reviravolta protagonizada no Barradão garante um dos acessos mais marcantes da Terceirona nos últimos anos. O Vitória ressurgiu das cinzas e, abraçado por sua torcida, conseguiu uma milagrosa classificação para a segunda fase. A guinada se tornou completa neste sábado, com a promoção ratificada após o empate por 1 a 1 com o Paysandu, em Belém. A epopeia que merece muitas narrativas é a esperança de dias melhores com apoio de sua gente.
Disputar a Série C não era um drama inédito para o Vitória. Os rubro-negros retornavam à terceira divisão nacional depois de 16 anos, com o acesso imediato na longuíssima campanha de 2006. Entretanto, a recuperação do Leão da Barra em 2022 não se indicava tão simples, com a crise que se aprofundou no início da temporada e a falta de perspectivas para realmente retornar à Segundona dentro das circunstâncias limitadas. E os piores temores se confirmaram durante as primeiras rodadas da terceira divisão. Foram três derrotas nas primeiras três rodadas, que ainda se combinaram com a eliminação diante do Fortaleza na Copa do Brasil. O técnico Geninho logo perdeu o emprego.
Os sinais de reação do Vitória foram bem tímidos durante a primeira metade da fase de classificação. A equipe conquistou somente três vitórias nas primeiras 12 rodadas. O Leão da Barra ocupava a zona de rebaixamento e as chances de classificação não chegavam a 3%. Em consequência, o técnico Fabiano Soares foi o segundo demitido da campanha, em meados de junho. A troca no comando se justificava pela falta de resultados e também pela falta de consistência em campo. Uma decisão que se tornou providencial, pelo impacto garantido por João Burse, antigo comandante da base rubro-negra que vinha de um trabalho no Cianorte. Ainda existia uma desconfiança inicial, mas o encaixe do novo técnico foi instantâneo.
O novo treinador ainda estreou com empate diante do Altos, mas a escalada logo se iniciou a partir de julho. Abraçado por sua torcida, o Vitória apresentava bem mais solidez em campo e emendava triunfos. Foram três consecutivos, que já deixaram a zona de rebaixamento para trás. Dois empates frearam um pouco a arrancada, mas as chances de classificação permaneciam ao alcance para os dois compromissos finais. Depois de bater o Mirassol fora de casa, o Leão contou com o Barradão lotado na rodada final e cumpriu sua missão com os 3 a 1 sobre o Brasil de Pelotas. O que antes parecia inacreditável agora se cumpria, com a passagem dos baianos para o quadrangular semifinal.
O Vitória caiu no grupo de camisas mais pesadas da fase decisiva da Série C, ao lado de ABC, Figueirense e Paysandu. O triunfo por 1 a 0 sobre o Paysandu dentro do Barradão revigorava as esperanças, mas o fim da série invicta desde a chegada de Burse veio com um golpe duro – a derrota por 5 a 1 na visita ao Figueira dentro do Orlando Scarpelli. Empates consecutivos sem gols contra o ABC travavam a campanha, embora as chances seguissem de acesso na mesa. E o Leão adorou jogar contra as probabilidades na Terceirona, o que faria novamente no sprint final.
O momento da virada aconteceu na penúltima rodada, contra o Figueirense em Salvador. Os rubro-negros absorveram a força das arquibancadas lotadas e arrancaram o triunfo por 1 a 0, gol de Tréllez, em placar preservado mesmo com uma expulsão no segundo tempo. Com isso, os baianos entravam na zona de classificação e passavam a depender apenas de si para confirmar o retorno à Série B. Haveria uma disputa paralela com o Figueirense na rodada final, já que o ABC tinha carimbado o acesso por antecipação e o Paysandu não possuía mais chances, na lanterna da chave.
Seria mais uma rodada de provação para o Vitória. A equipe encarava o Paysandu na Curuzu e, depois de um primeiro tempo sem gols, saiu em desvantagem no placar. Uma falha do goleiro Dalton permitiu o tento de Genílson, para o Papão, aos 15 minutos. Por sorte, o empate do Leão não demorou. Aos 22, Dionísio deixou tudo igual. No entanto, os rubro-negros seguiam ameaçados: com a igualdade, o Figueirense só precisava de um triunfo simples sobre o ABC. Não aconteceu. Enquanto o 1 a 1 prevaleceu em Belém, com o segundo gol do Paysandu anulado pelo VAR nos acréscimos, os catarinenses não saíram do 0 a 0 em casa contra os potiguares. O Vitória estava de volta à Série B.
João Burse se torna um personagem natural do acesso do Vitória. O treinador teve um aproveitamento impressionante desde a sua chegada, com sete triunfos e seis empates em 14 compromissos. É um técnico jovem, de apenas 40 anos, que já vinha de um longo trabalho no Cianorte e de uma passagem pela base do Palmeiras antes disso. Agora, marca seu nome no Barradão, depois de também trabalhar na base rubro-negra e dar seus primeiros passos no nível principal com o clube. É um comandante elogiado por seu trabalho minucioso, especialmente pela maneira como prepara o time e cria jogadas. Desta maneira, conquistou os vestiários em pouco tempo. Deu uma cara para o time e montou uma espinha dorsal.
Já dentro de campo, outros tantos foram importantes. Apesar da falha no jogo do acesso, o goleiro Dalton teve mais momentos de brilho, essencial no quadrangular semifinal. Alan Santos e Marco Antônio formaram uma firme dupla de zaga, enquanto nomes como Dionísio e Léo Gomes deram sustentação no meio. Mais à frente, Rafinha desequilibrou repetidas vezes para a guinada na fase de classificação, mas também aparecem dois velhos conhecidos da torcida. Tréllez teve altos e baixos, mas se provou vital nos momentos decisivos, sobretudo pelo gol da vitória sobre o Figueirense na penúltima rodada. No banco ainda havia o ídolo Dinei, importante pela liderança nos vestiários.
E, obviamente, há um protagonismo da torcida em meio a essa recuperação do Vitória. Nos momentos mais difíceis os rubro-negros abraçaram o time e empurraram a reação na Terceirona. O Barradão lotava à medida que a luz no fim do túnel se tornava maior, com dias inesquecíveis quando a classificação parecia se tornar palpável. O aeroporto lotou para mandar boas energias antes do triunfo sobre o Mirassol, enquanto a enorme comunhão nas arquibancadas completou o serviço diante do Brasil de Pelotas. E a fé se seguiu no quadrangular decisivo, inclusive para uma corrente de fé neste final de semana. O Barradão se encheu para ver o empate na Curuzu através de um telão e se tornou o ponto de encontro na comemoração do milagre que se cumpriu.
A permanência do técnico João Burse é um passo importante para 2023, assim como a manutenção de alguns destaques do elenco. Entretanto, o Vitória também busca uma estabilidade maior em seus bastidores. O clube atravessou uma queda de braço interna desde os meses finais de 2021, que levaram ao afastamento do cacique Paulo Carneiro da presidência e culminaram em sua destituição durante o último mês de maio. Fábio Mota assumiu o clube em meio às turbulências e terminou eleito nas urnas durante a última semana para presidir os rubro-negros até 2025. Poderá aproveitar essa onda positiva a favor de um crescimento mais consistente do Leão, mas ainda existem limitações financeiras que vão além do desempenho em campo.
O Vitória tem consciência da importância da Série B, por preencher o calendário e por garantir melhores recursos ao clube. No entanto, também anda devendo uma boa campanha no estadual, sem o título desde 2017 e repetidas quedas na fase de classificação. O trabalho de reconstrução do Leão da Barra não é simples, diante de sua tradição e da história de um clube representativo à elite do futebol nacional. A grandeza, de qualquer maneira, está diretamente ligada à torcida. E foi essa multidão rubro-negra quem recobrou o brio em meio a meses tão difíceis. O orgulho por essa façanha na Série C se traduz por aquilo que se viveu nas arquibancadas.
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